Acima da média nacional, cidades da região de Ribeirão Preto perdem até 69% da água no abastecimento


Volume de vazamentos e ligações ilegais passa dos 94 bilhões de litros por ano em 11 municípios, segundo novo sistema de informações do Ministério das Cidades. Ribeirão Preto é a que mais perde em termos absolutos e São Joaquim da Barra é a que acumula o maior percentual de perdas. Problemas estruturais causam problemas em fornecimento de água em São Joaquim da Barra, diz MP
Reprodução/EPTV
Municípios da região de Ribeirão Preto (SP) perdem até 69% da água utilizada no abastecimento dos moradores, segundo dados recém-divulgados pelo novo Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (Sinisa).
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Ao todo, 11 cidades registraram índices acima de 39%, a média nacional, e juntas perdem 94,7 bilhões de litros por ano, entre desperdícios causados por vazamentos e ligações clandestinas não faturadas pelo sistema público.
“Um bem escasso tem que ser gerido com muito cuidado e não com tantas perdas”, afirma Marcelo Marini Pereira de Souza, professor de pós-graduação em Sustentabilidade na USP de Ribeirão Preto e presidente da Associação Cultural e Ecológica Pau Brasil.
No topo, com o maior percentual, está São Joaquim da Barra (SP), que em 2022, quando perdia 71%, foi alvo de uma ação civil pública por conta de problemas estruturais na rede. A ação segue em curso até hoje, segundo o MP, com apuração das causas e na pendência de esclarecimentos por parte da Prefeitura. A cidade tem o terceiro maior índice de perda total por ligação – com 1,2 mil litros por dia – só atrás dos municípios de Valparaíso (SP) e Cedral (SP).
Colina (SP), Serrana (SP), Orlândia (SP), Batatais (SP) e Sertãozinho (SP) aparecem na sequência. Maior cidade da região, e conhecida por ser 100% abastecida pelo Aquífero Guarani, Ribeirão Preto (SP) registra um desperdício de 41,6%, inferior ao registrado anteriormente, de 43%, mas ainda assim acima da média nacional e com o maior volume absoluto desperdiçado no estado, atrás apenas de São Paulo. Veja a lista abaixo:
São Joaquim da Barra: 69,23%
Colina: 67,08%
Serrana: 65,41%
Orlândia: 63,79%
Batatais: 52,26%
Sertãozinho: 49,92%
Cristais Paulista: 44,44%
Patrocínio Paulista: 43,6%
Santo Antônio da Alegria: 43,06%
Ribeirão Preto: 41,67%
Aramina: 40,06%
Pertencente ao Ministério das Cidades, o Sinisa substitui o antigo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), mas mantém as mesmas bases de coleta de dados, referentes a abastecimento, coleta de esgoto e águas pluviais, além de incluir informações sobre gestão municipal.
Perdas somam 94,7 bilhões de litros por ano

Os 11 municípios, juntos, produzem por ano 200,3 bilhões de água, mas, entre perdas reais e aparentes, perdem 94,7 bilhões de litros na distribuição.
Em São Joaquim da Barra, por exemplo, onda há 20.314 ligações ativas, em média se desperdiça 1,2 mil litros por ligação por dia, o que resulta em 8,9 bilhões de litros perdidos em um ano, de um total de 12,8 bilhões produzidos.
Por ter uma produção maior de água e um número maior de ligações, Ribeirão Preto, em volumes absolutos, desperdiça ainda mais. O município registra uma perda média de 700 litros por dia para cada uma de suas 210.976 ligações ativas. Em um dia, isso representa 147,7 milhões de litros. Em um ano, são quase 54 bilhões de litros perdidos de mais de 129,4 bilhões distribuídos.
Esse é o maior valor registrado entre todos os municípios do estado de São Paulo, com exceção da capital.
Vazamento de grande proporção de água potável em Ribeirão Preto (SP)
Lucas Faleiros/CBN Ribeirão
Ao mesmo tempo em que perdem muitos recursos hídricos, essas cidades também registram ocorrências de falta d’água. Segundo o Sinisa, as 11 cidades, juntas, tiveram em 2023 quase 26 mil reclamações, com predominância de Ribeirão Preto, com quase 24 mil. Na sequência aparecem São Joaquim da Barra, com 500 queixas, Serrana, com 411, e Sertãozinho, com 335.
Consumo por habitante
O levantamento também mostra que 55 cidades da região têm um consumo por habitante acima da média nacional, de 159 litros por dia. Em Aramina (SP), onde 90% dos recursos são destinados à irrigação, essa utilização média subiu de 581 litros para 609 por dia, número quase quatro vezes maior do que o que se consome em todo o país. Ipuã (SP), São Simão (SP) e Barrinha (SP) também se destacam nesse ranking.
Apesar da queda nas perdas da distribuição, a média de consumo da população de Ribeirão Preto (SP) subiu de 272 para 293,87 litros por habitante por dia. Veja as dez cidades com maior consumo de água por habitante na região:
Aramina : 609,87
Ipuã: 542,49
São Simão: 514
Barrinha: 450,98
Pradópolis: 381,2
Cravinhos: 360,5
Pitangueiras: 318,38
Ituverava: 318,26
Ribeirão Preto: 293,87
Pontal: 291,64
Entre os municípios com maior consumo, a maioria destina sua captação principalmente para atividades agrícolas e industriais, caso de Aramina, Batatais, Colina e Serrana, por exemplo, segundo dados da Agência Nacional de Águas (ANA). Ribeirão Preto, por sua vez, destina 75% de seus recursos para abastecimento urbano.
‘Não tem nada que se sustente com tanta perda’
Embora questione a precisão dos números, por serem divulgados pelas próprias prefeituras, o professor Marcelo Marini Pereira de Souza afirma que os dados são um indicativo muito preocupante, sobretudo em Ribeirão Preto, 100% abastecida pelo Aquífero Guarani.
“É urgentíssimo em função de perdas. Nada pode viver com tanta perda, nada se sustenta. Não tem nada que se sustente com tanta perda. Segundo, a agua subterrânea que era tempo atrás muito abundante, tinha mais oferta do que demanda, hoje tem muito mais demanda que oferta. Portanto ela é escassa.
O problema passa por um cuidado com relação à concessão das outorgas, à fiscalização para o combate às ligações clandestinas e também ao controle de outras práticas prejudiciais, como abandono de poços e poluição.
“Não apenas os poços de abastecimento público que por si só já merecem um grande cuidado, mas temos também poços particulares, poços ilegais que não são registrados, tudo isso leva a oferta de água muito cuidadosa, e tem ainda os pontos de contaminação do aquífero, que são os poços abandonados sem o devido cuidado, a água subterrânea entra pelo solo, pela infiltração.”
Com relação ao consumo, o professor da USP enfatiza a importância de se fiscalizar não só as condições do abastecimento urbano, mas também a irrigação agrícola, a maior consumidora de recursos hídricos do país.
“Se nós queremos economizar agua, não podemos começar por aquele que menos consome ou que consome de maneira controlável ou que consome de maneira difusa”, argumenta.
O que dizem as Prefeituras
Batatais
A Secretaria de Obras, Planejamento e Serviços Públicos de Batatais confirmou que, de uma maneira geral, as estruturas de abastecimento da cidade precisam de reformas, algumas delas já em andamento, como a estação de tratamento de água, outras “mais agudas”, ainda em fase de estudo, e intervenções “menos severas”, como é o caso dos poços, que, segundo a administração municipal já estão sendo providenciadas.
“As estações elevatórias de água bruta e tratada necessitam de ajustes principalmente quando levamos em consideração a eficiência energética. Neste aspecto, a Secretaria está adquirindo os componentes necessários para estas adequações”, comunicou.
A pasta também informou que, apesar desses problemas e de intermitências no serviço por conta da elevada perda em determinados pontos, o sistema é capaz de atender a demanda do município.
“Diante da análise do município como um todo, verificou-se que o volume de reservação, atualmente, atende o volume necessário para atendimento da população por 1/3 do dia de maior consumo, dado este preconizado por norma técnica.”
Colina
O Serviço Autônomo de Água de Colina informou que uma das causas para as perdas no município era a falta de hidrômetros em prédios públicos e escolas – que impede a medição e resulta em perdas aparentes, ou seja, não faturados – e que há três meses tem tomado providências como o fim da isenção da taxa de água e a fixação de um valor único para esses espaços, bem como um novo sistema de cobrança para inadimplentes.
“A gestão atual intensificado a fiscalização no sentido de identificar ligações clandestinas, evitando fraudes”, acrescentou.
Patrocínio Paulista
Em Patrocínio Paulista, o Saepp (Serviço de Água e Esgoto de Patrocínio Paulista) informou estar ciente da perda e que tem adotado medidas para reduzir esse índice. “Um dos principais investimentos está sendo a implementação de sistemas de telemetria, que ajudam a monitorar em tempo real os níveis dos reservatórios, permitindo identificar e evitar extravasamentos”, comunicou.
O órgão também informou estar iniciando a medição do consumo não faturado, que ainda apresenta altos índices.
“Essas ações visam melhorar a gestão dos recursos hídricos e, com o tempo, devem refletir em uma redução significativa do índice de perdas, trazendo mais eficiência para o abastecimento de água na cidade.”
Ribeirão Preto
A Prefeitura de Ribeirão Preto informo que tem atuado em três frentes de trabalho diferentes para para melhorar o abastecimento da cidade.
A curto prazo, a administração realizou 3.218 reparos de vazamentos não visíveis entre janeiro e fevereiro deste ano encontrados por meio de geofonagem. A médio prazo, licitou a abertura de cinco poços, quatro reservatórios e outras melhorias por meio de recursos já obtidos anteriormente pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e pelo Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa). A logo prazo, equipes da engenharia estão desenvolvendo projetos para inverter o sistema de abastecimento, para que ele ocorra por gravidade e não por marcha.
“No sistema em marcha a água do poço é levada diretamente para a rede, o que ocasiona mais pressão facilitando o rompimento de tubulação e vazamentos. Já no sistema em gravidade, a água extraída do poço é direcionada para o reservatório que distribui para a rede em gravidade, diminuído significativamente a pressão e perdas.”
Com relação ao elevado consumo, a Prefeitura citou medidas de orientação e conscientização, inclusive com grupos escolares.
Não responderam
O g1 também entrou em contato com as prefeituras de São Joaquim da Barra, Serrana, Orlândia, Sertãozinho, Cristais Paulista, Santo Antônio da Alegria e Aramina, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
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